As formas alternativas de resolução de conflitos visam solucionar as disputas envolvendo o direito patrimonial disponível (ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação) de pessoas físicas e jurídicas de maneira rápida, eficiente e econômica, com menos riscos e melhores resultados.
O crescente interesse da sociedade brasileira pelos chamados meios alternativos ou adequados de solução de conflitos, também conhecidos como alternative dispute resolution – ADR, aliada à necessidade de conter a crise de lentidão do Judiciário, culminou na promulgação de novas leis que tratam sobre a mediação. São elas a Lei nº 13.140/2015 e a Lei nº 13.105/2015, esta última mais conhecida como o Novo Código de Processo Civil (NCPC). O estudo do tema no país deve necessariamente passar por esses dois textos, que, intercalados, disponibilizam aos operadores do Direito aspectos relacionados à organização dos centros judiciários e câmaras privadas, bem como ao próprio procedimento da mediação.
Podemos definir mediação como um processo de negociação conduzido por um terceiro imparcial, escolhido de comum acordo pelas partes, a quem são atribuídas funções específicas, com o fim de ajudar na busca de uma solução para o conflito.
Já de antemão, chama a atenção o disposto no parágrafo 4º, art. 334 do NCPC/2015, dispondo que a audiência de conciliação ou mediação somente não será realizada logo após o ajuizamento da ação, caso ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse, ou quando não se admitir a autocomposição. De certa maneira, a nova lei parece tentar eliminar uma das características da mediação, qual seja, a voluntariedade. De toda forma, o NCPC/2015 representa um grande incentivo à autocomposição desde o início das lides, seja através da mediação ou da conciliação.
A conciliação tem por característica abranger litígios pontuais e menos complexos, preferencialmente relacionados a aspectos patrimoniais. A atuação do conciliador deve ser no sentido de incentivar o alcance de um consenso entre as partes, sendo inclusive possível expor seu ponto de vista, mas sempre atento para evitar qualquer espécie de coação.
A mediação, por sua vez, é aconselhável para casos envolvendo relações continuadas, sejam empresariais ou pessoais. A postura do mediador não deve ter por escopo a busca de acordo, diretamente. O ideal é que ele encoraje a troca de informações, auxilie na compreensão dos pontos de vista de cada parte e delimite os temas a serem abordados em cada uma das etapas da mediação. De acordo com o art. 15 da Lei nº 13.140/2015, a pedido das partes ou do próprio mediador, poderão ser admitidos outros mediadores para funcionarem no mesmo procedimento, quando isso for recomendável em razão da natureza e da complexidade do conflito.
Quando o mediador se depara com partes cuja intenção é se envolverem em barganhas baseadas em posição, ou seja, quando se verifica verdadeira disputa de poder por vaidade sem maiores utilidades do ponto de vista prático, cabe a ele desenvolver um plano de mediação para deslocar, rapidamente, a intenção das partes para barganha baseada em seus próprios interesses. Como se vê, cabe ao mediador fomentar a busca pela concretização de objetivos possíveis e práticos, de modo que os resultados sejam satisfatórios para todos.
Dentre as características da mediação, podemos citar a confidencialidade e a flexibilidade, características evidentemente abrangidas pelos princípios que regem a mediação, expostos no art. 2º da Lei nº 13.140/2015, a saber, I – imparcialidade do mediador; II – isonomia entre as partes; III – oralidade; IV – informalidade; V – autonomia da vontade das partes; VI – busca do consenso; VII – confidencialidade; VIII – boa-fé.
O art. 19 incorpora bem os princípios apontados acima ao prescrever que no desempenho de sua função, o mediador poderá reunir-se com as partes, em conjunto ou separadamente, bem como solicitar informações que entender necessárias para facilitar o entendimento entre elas.
Ainda analisando a Lei nº 13.140/2015, nota-se autorização para instauração de procedimento de mediação entre particular e pessoa jurídica de direito público; seja a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, que poderão criar câmaras de prevenção e resolução administrativa de conflitos, no âmbito dos respectivos órgãos da Advocacia Pública, onde houver, com competência para: I – dirimir conflitos entre órgãos e entidades da administração pública; II – avaliar a admissibilidade dos pedidos de resolução de conflitos, por meio de composição, no caso de controvérsia entre particular e pessoa jurídica de direito público; III – promover, quando couber, a celebração de termo de ajustamento de conduta.
Interessante notar que o NCPC/2015 autoriza o trabalho de mediação realizado não só por câmaras públicas, mas também por instituições privadas. Essas últimas deverão estar inscritas em cadastro nacional e em cadastro de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal, que manterá registro de profissionais habilitados, com indicação de sua área profissional.
Dentre as câmaras públicas, podemos citar o Grupo de Mediação e Resolução de Conflitos do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e o Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Tais câmaras oferecem serviços gratuitos.
Entre as câmaras privadas, é comum a cobrança de taxa de registro, além dos honorários do mediador.
De modo que as partes ou potenciais partes tenham acesso a informações relativas aos profissionais aptos a exercerem a função de mediador, o Código de Processo Civil prevê que todos os dados relevantes dos mediadores deverão ser disponibilizados quando do credenciamento das câmaras, tais como o número de processos nos quais participou, o sucesso ou insucesso da atividade, a matéria sobre a qual versou a controvérsia, bem como outros dados que o tribunal julgar relevantes.
Tais dados serão classificados sistematicamente pelo tribunal, que os publicará, ao menos anualmente, para conhecimento da população e para fins estatísticos e de avaliação das câmaras privadas de conciliação e de mediação.
De acordo com a lei, na mediação extrajudicial, as partes poderão ser assistidas por advogados ou defensores públicos. Já na mediação judicial, isto é, aquela instaurada após o ajuizamento de ação judicial, as partes deverão ser assistidas por advogados ou defensores públicos, nos termos do art. 26 da mesma lei.
Encerrado o procedimento de mediação, quando for celebrado acordo, ou mesmo quando não se justificarem novos esforços para a obtenção de consenso, será lavrado seu termo final, seja por declaração do mediador nesse sentido ou por manifestação de qualquer das partes.
O termo final na hipótese de celebração de acordo, constitui título executivo extrajudicial e, quando homologado judicialmente, título executivo judicial. No que diz respeito à possibilidade de desconstituição dos títulos através da via judicial, naturalmente deverão ser adotadas as regras previstas no NCPC/2015, mais especificamente nos artigos 525 e 917.
As leis acima analisadas ainda possuem outros aspectos que merecem estudo detalhado. De toda forma, entendemos que as observações aqui lançadas representam, ao menos, um incentivo à adoção da prática da mediação no Brasil. De fato, para que realmente essa modalidade de solução de conflito seja aceita pela comunidade jurídica e pela sociedade como um todo, não basta apenas a imposição da lei. Na realidade, é necessário que magistrados, advogados e doutrinadores se empenhem em estimular permanentemente o uso desse procedimento.
Vitor Sepulveda Gomide
Sócio de Malka Y Negri Advogados
Disponibilizamos diversos artigos elaborados pela equipe, alguns veiculados em jornais de grande circulação e também em mídia especializada.www.malkaynegriadvogados.com.br