A pandemia que se espalhou mundo afora, sem dúvida alguma, pode ser entendida, na ótica do Direito, como fato inevitável.
No campo contratual, em regra, em decorrência do princípio pacta sunt servanda, os contratos devem ser cumpridos. No entanto, essa força obrigatória com a vinculação das partes encontra no ordenamento jurídico exceção pela Teoria da Imprevisão, haja vista que o contrato deverá ser cumprido rebus sic stantibus, ou seja, “estando as coisas como estão”.
A pandemia que se espalhou mundo afora, sem dúvida alguma, pode ser entendida, na ótica do Direito, como fato inevitável (art. 393 do Código Civil) e, por isso, afeta, inexoravelmente, praticamente todos os tipos de negócios jurídicos. Há casos em que o comprador a prazo de um imóvel, simplesmente não está conseguindo honrar com as suas obrigações. E, lamentavelmente, há situações em que o adquirente, tendo sido contaminado pelo Covid-19 venha a óbito. Com efeito, no momento em que este artigo está sendo redigido (27/04/2020), o Brasil contabiliza mais de 4.000 mortes. É uma tragédia, sem precedentes no mundo moderno, principalmente se imaginarmos que os números são, ainda, crescentes.
Para o caso aqui tratado, reprisamos, uma vez mais, o que desde o início temos recomendado. Agir com boa-fé, transparência, seriedade e lealdade. Esta prática, com toda a certeza, evitará uma ruptura contratual litigiosa e, por óbvio, o processo judicial.
Todavia, não há como assegurar que todos os casos serão resolvidos na linha sugerida. Dito isso, será importante acomodar os ditames legais, até o ponto em que se possa determinar o caminho apropriado.
Basicamente, ao tratar de contratos de promessa de compra e venda firmados entre incorporadoras/construtoras, na qualidade de vendedoras, e pessoas físicas, como compradoras, normalmente envolvendo imóveis vendidos ainda na fase de construção (“imóvel na planta”), trabalharemos com o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor. Daí porque, inicialmente transcrevemos os dispositivos legais a serem aplicados. Confira-se:
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Código Civil
Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.
Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.
Código do Consumidor
Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.
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Pois bem, o que poderá então acontecer se o comprador não honrar com as prestações?
O vendedor, pretendendo manter o contrato, poderá cobrar a dívida integralmente, cabendo ao comprador comprovar a causa do não pagamento para se valer das opções que veremos nos itens abaixo:
a) O comprador, demonstrando a impossibilidade de pagamento, poderá postular a suspensão temporária do pagamento, a diluição do saldo em prazo maior e até mesmo, a revisão do contrato (arts. 317 e 480 do Código Civil);
b) O comprador, demonstrando a impossibilidade de pagamento, poderá postular a resolução (encerramento) do contrato (art. 478 do Código Civil). Igualmente neste caso, caberá a devolução de parte do valor dispendido pelo comprador.
Em uma segunda hipótese, o próprio alienante poderá optar pela rescisão decorrente do inadimplemento. Todavia, neste caso, nos termos do artigo 53 do Código do Consumidor, deverá restituir parte do preço até então recebido. O percentual e a forma de devolução da quantia dependerão da data que foi firmado o instrumento para compra e venda do imóvel entre as partes
Fato é que os incorporadores dos imóveis vendidos na planta estão atentos, tentando traçar o perfil dos casos, tanto que o “presidente da Trisul, Jorge Cury, diz que identificou duas vertentes. Clientes de imóveis de alto padrão (acima de R$ 650 mil) estão buscando renegociar os pagamentos, enquanto os de médio padrão (entre R$ 250 mil e R$ 650 mil) começaram a pedir o distrato. “A amostragem é pequena, pois a crise veio há apenas duas semanas, mas a tendência é que esses distratos se acentuem. A classe média vinha se recuperando, mas muita gente vai perder emprego e profissionais autônomos vão perder renda”, estima Cury. “Vamos buscar um rearranjo. E nós faremos sem multa e juros, porque temos interesse em manter a venda.” [fonte: www.infomoney.com.br/minhas-financas/consumidor-tenta-renegociar-imoveis-comprados-na-planta-frente-a-pandemia ]
Jacques Malka Y Negri
http://malkaynegriadvogados.com.br/